No século XIX o físico alemão Rudolf Clausius (1) formulou o conceito de entropia. A entropia se referia à energia presente num sistema termodinâmico que não era disponível para o trabalho. A energia estava lá, mas não podia ser utilizada. Esse conceito ficou conhecido como a segunda lei da termodinâmica que diz que a entropia de qualquer sistema sempre tende a aumentar. A única condição estável de um sistema é a máxima entropia, a aleatoriedade total. Com o passar do tempo a entropia se tornou uma medida genérica da desordem presente em qualquer sistema.
Segundo Ludwig Boltzmann (2), físico austríaco, a desordem é o aumento do número de possíveis estados equivalentes em que o sistema pode se encontrar. Portanto, a entropia é uma medida da variedade de opções, da incerteza oriunda das múltiplas escolhas, da diversidade.
Em 1990, Kenneth D. Bailey (3) escreveu sobre a Teoria da Entropia Social (SET). Ele define a sociedade como uma população (P), com informação (I), situada numa área espacial (S), com tecnologia (T), nível de vida (L) e organização (O). Essas seis variáveis seriam propriedades macro sociológicas que poderiam definir e mensurar o conhecimento mínimo dos membros individuais da sociedade, exceto a população que é simplesmente a soma da existência de todos os indivíduos membros da sociedade. Já que este texto foi escrito quando a internet estava bem no seu início ele não foi pensado para considerar uma sociedade em rede, o que muda profundamente a forma como pensamos o social no século XXI. Hoje já consideramos, por exemplo, que a sociedade que emerge da interação social é muito maior que a soma das partes. A capacidade de auto-organização do sistema é uma propriedade dos sistemas complexos adaptativos (SCA), sistemas que produzem ordem.
Se entendemos a sociedade humana como um SCA, existem algumas possibilidades a serem exploradas:
- A desordem de Boltzmann pode ser identificada como desordem social, pois o caos da sociedade sempre tende a crescer;
- A entropia pode ser uma medida da insatisfação do indivíduo e das massas, pois a insatisfação social tende a crescer;
- A entropia social é a soma de todas as ideias, opiniões, comportamentos e atitudes aceitas pela sociedade. É definida pela diversidade e tende a crescer. Como temperatura e entropia são conceitos intimamente relacionados, a temperatura social mede a igualdade de direitos entre os indivíduos de uma sociedade. Então, numa sociedade justa a entropia tende a crescer e a temperatura a se homogeneizar. (5)
Por outro lado, qualquer grupo socialmente constituído tende à dissolução, ao longo do tempo. A história está repleta de sociedades que se constituíram e desapareceram, quer seja porque foram totalmente eliminadas ou porque se miscigenaram com outros povos dando origem a algo novo. Na sociedade atual o conceito de “pureza racial” não se aplica. Nossas árvores genealógicas estão, geralmente, repletas de miscigenações.
Grupos sociais menores, como grupos de trabalho, de estudos, de amigos, familiares e outros, também podem ser entendidos da mesma maneira: são vínculos transitórios que tendem à inexorável dissolução ao longo do tempo, ainda que isso possa acontecer, em alguns casos, apenas com a morte física.
Pensando a sociedade humana como uma rede de conexões entre pessoas, a entropia social é a tendência à dissolução, ao longo do tempo, de todos os vínculos que nos conectam à sociedade.
Tal como a água em estado líquido a sociedade humana é fluida, conexões se formam e desaparecem continuamente definindo e mudando estruturas sociais. As estruturas socias existem apenas em intervalos de tempo e se remodelam continuamente dentro desses intervalos. Essas estruturas se enredam em outras estruturas através das conexões humanas criando um enorme emaranhado social. Não é possível entender essas estruturas de forma isolada, mas apenas como continuidades sociais (continuum social). Importante notar que conexões e vínculos se estabelecem pelo fluxo de informações. Quando seres humanos se conectam a outros seres humanos, isso quer dizer que se estabelece um fluxo de informações entre eles. Conexão é sempre fluxo.
Quando pensamos numa organização o princípio é exatamente o mesmo: as pessoas numa organização estão conectadas pelo fluxo de informações e a estrutura está sujeita à entropia, vai se dissolver ao longo do tempo. Nesse sentido, a insatisfação organizacional pode indicar se a rede está, ou não, próxima da dissolução. A dissolução aqui pode se referir a uma nova maneira de distribuir o fluxo de informações ou, em casos mais drásticos, ao encerramento das atividades da rede. É importante notar que a insatisfação social é apenas uma das muitas probabilidades que levam à dissolução de uma rede. Pode ser, por exemplo, que a rede se dissolva simplesmente porque seu objetivo já foi cumprido. No entanto, note-se que a entropia social é um fenômeno presente em todas as organizações.
REFERÊNCIAS
- Luiz A Horta Nogueira, (2022), Clausius, a entropia e a seta do tempo, Revista Brasileira de Energia 28(1), DOI: 10.47168/rbe.v28i1.701
- Silvio R Dahmen, (2006), Boltzmann: Vida e Obra, Revista de Ensino de Física 30(2):16-22
- Kenneth D. Bailey (1990). Social Entropy Theory, State University of New York Press. Albany.
- Mayer, Thomas F., (1991), Social Entropy Theory, Kenneth D. Bailey, American Journal of Sociology, 96(6), 1544–1546. doi:10.1086/229700
- Luiz Eleno, (2011), Entropia Social: uma termovisão de mundo, Lorena School of Engineering, Universidade de São Paulo (USP)