ONA ao estilo Neuroredes

Para uma empresa muito mais importante do que aquilo que você sabe é o que você é capaz de compartilhar com as outras pessoas. De nada adianta saber muito e entesourar informações, ainda que isso possa não acontecer intencionalmente.

Empresas podem ser definidas como resultados de uma emergência criativa. Emergem a partir da dinâmica do fluxo de informações. O que importa é o que ocorre entre as pessoas, pois não importa a personalidade que cada um tenha, todos vivemos em fluxo: transformamos e somos transformados continuamente através do fluxo de informações.

O fluxo de informações numa organização é tão importante quanto o fluxo de sangue num organismo humano. Sem ele a existência organizacional é impossível. A interrupção desse fluxo pode levar a distorções de realidade e impactar negativamente a empresa. Por exemplo, se você não tem o mapa da cidade, vai ser muito complicado encontrar o endereço para o qual você tem que ir. Para fazer qualquer coisa informações são cruciais. E as informações sempre vêm de outros seres humanos que utilizam diversos meios para torná-las disponíveis.

A gestão organizacional hoje é focada em pessoas, em suas habilidades e personalidades e na posição que ocupam na hierarquia. Quanto mais alta a posição hierárquica mais informações recebem, portanto mais capacitadas estão para criar estratégias para o desenvolvimento da empresa. Isso quer dizer que as pessoas ao nível operacional não recebem o mesmo fluxo de informações que os estrategistas e é exatamente essa diferença no fluxo de informações que define o status organizacional. Isso sempre funcionou relativamente bem quando, de fato,  existiam grandes diferenças de conhecimento entre os estrategistas e as pessoas trabalhando ao nível operacional: uns trabalhavam com ideias e os outros com os músculos. Mas será que continua funcionando bem, ou será que isso se tornou um problema numa sociedade totalmente conectada?

Para responder a essa questão temos que considerar algumas perspectivas:

  • Com a crescente conectividade, os clientes estão mais empoderados do que nunca, tendo amplo acesso a informações sobre produtos e serviços. A satisfação do cliente pode ser diretamente impactada pelo conhecimento e eficácia das equipes operacionais e táticas. Um único cliente insatisfeito pode provocar um enorme problema para a empresa. Em 2008 uma banda de música embarcou em um avião da United Airlines (UA) nos EUA. Pela janela do avião puderam observar que seus instrumentos musicais, que tinham sido despachados junto com a bagagem, eram jogados pelos funcionários, de um lugar a outro, sem o menor cuidado. Quando chegaram ao destino encontraram um violão quebrado. Durante dois anos tentaram que a UA se responsabilizasse pelo estrago, até que uma funcionária disse que definitivamente eles não fariam isso. Foi então que a banda fez uma música chamada “United breaks guitars” contando a história toda e a postou no Youtube (1). Rapidamente o vídeo se tornou viral alcançando milhões de pessoas em poucos dias e ocasionando a queda de valor nas ações da empresa. Um único cliente insatisfeito e criativo fez um estrago enorme na imagem da empresa. Quem errou? A empresa toda, pois além de cometer erros com a bagagem também erraram feio no sentido de corrigir o que haviam feito e certamente muitas pessoas participaram nesse processo.
  • A decoerência da informação (DI) é outra perspectiva que precisamos considerar. Em física a decoerência quântica é a perda de informação de um sistema para o meio ambiente, uma vez que qualquer sistema está acoplado ao estado energético que o cerca. Numa organização a DI tem a ver com a transição de informação de um ser humano a outro até que a informação chegue à pessoa que fará um uso adequado dela. Por exemplo, o pessoal operacional em contato com o cliente tem muitas informações que são importantes para decisões estratégicas. Numa empresa hierárquica essa informação vai trafegar por vários níveis antes de chegar ao C-level. Em cada transição (saltar de um ser humano a outro) a informação perde coerência. Uma preposição a mais, uma vírgula a menos, um ponto que falta e quando a informação chega pode-se dizer que ela já está bem modificada. Em síntese, a informação sofre perturbações ao longo do caminho e chega com ruídos ao receptor final. Há uma boa probabilidade de que a decoerência da informação tenha sido um dos fenômenos responsáveis pelos erros dos estrategistas da United Airlines. O que se observa é que erros, principalmente os estratégicos, acontecem quando o fluxo de informações sofre uma ruptura ou bloqueio, quer seja por DI ou por outro motivo qualquer.
  • Vários estudos demonstram que a insatisfação dos funcionários tem crescido exponencialmente nos últimos anos. Pesquisa de novembro de 2022 do site empregos.com apontou que no Brasil em 2023, três em cada quatro funcionários queriam mudar de emprego. Outra pesquisa encomendada pelo Linkedin em 2023, que ouviu 23.000 pessoas em 16 países aponta que 60% dos funcionários estavam insatisfeitos no trabalho e 20% já buscavam uma nova colocação. (2) Isso indica que, no mínimo, a retenção de talentos e o bem estar no trabalho são dificuldades que estão aumentando. No entanto, temos que considerar que esses problemas também têm impactos na criatividade e na capacidade de inovação das empresas que são essenciais para a sobrevivência das organizações atualmente.

Hierarquias estáticas com inteligência concentrada no nível estratégico não funcionam mais adequadamente, por vários motivos e é importante pensar em outras alternativas, como a inteligência coletiva.

Como saber se o fluxo de informações na sua organização está funcionando ou se existem problemas e onde eles estão? A análise de redes de relacionamento organizacional (ARRO) ou ARO (Análise de Redes Organizacionais) serve exatamente para isso. Também é conhecida como ONA (Organizacional Network Analysis) ou HNW (Human Network Analysis). Com uma ARO é possível:

  • Entender como funciona o fluxo de informações entre as diferentes áreas, pessoas e níveis hierárquicos, ou quaisquer outros aspectos que se queira considerar. Essas informações ajudam muito a tomar decisões estratégicas, a montar grupos de trabalho eficazes, a entender se a organização lida com diversidade e é inclusiva, em suma, auxilia a compreender toda a dinâmica do grupo pesquisado. Existe sempre uma maneira de direcionar a análise para aquilo que se considera necessário. Por exemplo, talvez seja importante saber como funcionam as redes de decisão da organização, ou as redes de inovação, ou ainda as redes de expertise técnica, ou outras;
  • Saber se existem pessoas isoladas do fluxo de informações. Se o conhecimento da pessoa isolada é considerado importante para a organização é preciso pensar em estratégias para reconecta-la à rede, caso contrário talvez seja mais interessante para ambas as partes o desligamento da rede;
  • Saber se a organização é mais competitiva ou mais cooperativa. A competitividade interna é ruim para os negócios, embora exista naturalmente em ambientes hierárquicos onde as possibilidades de promoção se afunilam, quando a competitividade é maior que a cooperação interna várias coisas ficam comprometidas, como a produtividade, a inovação, o ambiente de bem estar no trabalho e etc.;
  • Saber se existem pessoas consideradas tóxicas pelos grupos nos quais atuam. Algumas pessoas não têm bom desempenho no contexto de trabalho nos quais estão inseridas. Pode ser que em outros contextos funcionem bem. Identificá-las e criar estratégias para resolver essa dificuldade é importante, não só para essas pessoas, como também para todos os participantes do grupo no qual ela atua;
  • Quem são as pessoas mais influentes no contexto pesquisado. Essa informação pode ajudar em situações de promoção e de estimulação da rede;
  • Em multinacionais podemos descobrir como é o fluxo das informações entre diferentes países, descobrindo se existem dificuldades e onde estão os pontos que precisam de atenção;
  • Na fusão de empresas sabendo qual é a estrutura relacional de cada uma fica muito mais fácil entender qual dinâmica de fusão aplicar: quem pode, ou não sair, quem colocar em cargos estratégicos, como montar grupos de trabalho com boa probabilidade de êxito e outras coisas mais;
  • Ao investir em uma empresa uma análise vai te mostrar como funciona a empresa, para além dos dados financeiros, e onde estão os problemas que precisam ser considerados;
  • Se você é um CEO que recém assumiu uma empresa uma análise vai te mostrar rapidamente em que ambiente você está se movendo. Isso vai te ajudar a perceber a organização de forma relacional entendendo-a de forma sistêmica. É como ter em mãos o mapa de uma cidade desconhecida que você precisa muito conhecer.

Observe-se que o objetivo de uma ARO é sempre revelar as relações organizacionais, que na maioria das vezes são invisíveis e não são facilmente perceptíveis. Todas essas informações provocam muitos “insigths” sobre aspectos organizacionais que ainda não foram percebidos, ou pensados. No caso da Neuroredes, as nossas ferramentas de análise (softwares) são voltadas para o C-level (em especial CEO´s), são extremamente simples de utilizar e não requerem nenhum conhecimento de programação.

Como é um processo de ARO ao estilo Neuroredes

1. Definir a rede primária e as sub redes

 O primeiro passo é descobrir a abrangência do mapeamento, ou seja, quem vai participar do processo, pode ser: a empresa toda, uma ou algumas áreas, um grupo específico ou várias empresas, etc. Onde houver pessoas interagindo a ARO é aplicável, independente do segmento em que a organização está inserida.

O segundo passo é descobrir quais sub redes dentro da rede primária serão observáveis, o que vai tornar a análise uma potente geradora de insights. Por exemplo, ao mapear uma empresa inteira de 200 pessoas (rede primária) é interessante descobrir como as diferentes áreas (sub redes) se relacionam, e/ou como as pessoas em diferentes cargos (sub redes) se relacionam, e/ou como a turma que joga futebol uma vez por semana (sub rede) funciona, e/ou como pessoas de identidades específicas (negros, LGBT´s, etc) estão inseridas no tecido social da organização, etc. Vários aspectos da rede primária ficam evidenciados o que facilita a compreensão da estrutura e da dinâmica da organização tornando a análise muito mais rica.

2. Definir qual a melhor maneira de buscar os dados de entrada.

Posto que, como já foi dito acima, as fontes de informação são sempre pessoas, a maneira mais eficaz de mapear uma rede é sempre fazendo perguntas às pessoas que vão participar do mapeamento. Os resultados obtidos através de perguntas são globais, precisos e muito confiáveis. Os participantes vão ter que responder a uma pesquisa relacional, ou seja, vão responder às perguntas feitas com relação aos outros participantes. Exemplos de perguntas usadas numa ARO:

  • Com quem você troca informações sobre o dia a dia da organização?
  • Com quem você conversa quando tem alguma decisão importante a tomar?
  • Com quem você conversa quando tem algum problema técnico na sua área?
  • Com quem você conversa sobre inovação e novas maneiras de fazer as coisas?
  • Com quem você tem conversas informais sobre a empresa?

Cada uma das perguntas vai mapear um aspecto do fluxo de informações organizacionais, respectivamente nos exemplos acima, rede de processos no dia a dia, rede de decisões, rede de expertise técnica, rede de inovação e rede informal (a famosa rádio peão). Claro que muitos outros aspectos podem  ser mapeados conforme a necessidade. Note-se que a Neuroredes trabalha com no máximo cinco perguntas por mapeamento. Isso se revelou, ao longo do tempo, mais que suficiente para entender uma organização com precisão. O excesso de dados pode ser tão prejudicial quanto a falta deles.

É possível buscar os dados de entrada de outras formas: através da troca de e-mails, nos aplicativos internos usados para a comunicação, em bases de dados das quais se possa extrair dados relacionais, rede de telefonia interna, agendas públicas, e outros. Embora essas opções possam parecer mais confortáveis, pois não envolvem a participação direta das pessoas (apenas softwares estão em ação), é importante pontuar que as conclusões não serão globais, mas apenas contextuais. Para tirar conclusões globais todos os meios utilizados para a transição de informações entre as pessoas teriam que ser mapeados, o que é uma tarefa praticamente impossível. Por exemplo, o WhatsApp, que é um dos meios de comunicação mais utilizados neste momento, não permite o acesso às suas bases de dados.

3. Análise

A Neuroredes sempre dá preferência ao mapeamento através de perguntas, embora possamos nos adaptar a contextos específicos. Temos um software de pesquisas relacionais desenvolvido especificamente para isso, que está na aba “Pesquisas” do site da Neuroredes (www.neuroredes.com.br). Depois que a pesquisa for encerrada todos os dados para análise ficam disponíveis em outro software que está na aba “Análises” e é aí que as pessoas habilitadas para ver os resultados devem entrar. Basicamente este software mostra a rede primária ( tecido social) e as sub redes (pedaços menores do tecido social) e gera um relatório síntese do que foi encontrado. Além das redes coletivas também é possível ver as redes individuais de cada participante o que vai mostrar como cada um está inserido no tecido social da organização.  É neste momento da visualização das redes coletivas e individuais que os insights costumam acontecer. Como os dados são muito sensíveis, somente as pessoas autorizadas previamente conseguem ter acesso a eles. Importante notar que nenhum dado sensível da organização fica guardado na nossa base de dados. Tudo é calculado sob demanda e em tempo real. Temos um forte compromisso com a segurança das informações.

Numa análise através de perguntas o processo demora apenas o tempo necessário para que as pessoas respondam à pesquisa. Obviamente esse tempo vai variar dependendo da quantidade de participantes.

Para que servem os resultados de uma ARO

Esses resultados são utilizados como uma ferramenta de gestão, auxiliando no processo de entender uma organização, descobrindo onde estão os pontos de atenção e facilitando a tomada de decisões no que concerne a estratégias internas.

Também podem ser utilizados como instrumento de transformação cultural facilitando a transição para a gestão com foco em inteligência coletiva. Nesse caso, todos os participantes recebem informações sobre redes de maneira geral (e porque são importantes) e sobre os resultados obtidos na análise, bem como cada um recebe seus próprios resultados individuais e se torna responsável por administrar suas próprias redes. Daí emerge uma potente dinâmica de inteligência coletiva com a participação de todos. Este processo é também extremamente simples.

É importante notar que se os resultados não são liberados para os participantes, muito provavelmente as pessoas não vão querer participar de muitas pesquisas. Podem responder a umas duas pesquisas, mas na terceira uma grande maioria vai se recusar. Observe-se que redes são extremamente dinâmicas, mudam constantemente ao longo do tempo. O ideal é fazer uma análise de redes uma vez por ano e comparar as análises para saber o que mudou nas relações, quem saiu, quem entrou e como tudo isso impactou a organização. Mas isso só vai funcionar se as pessoas tiverem acesso a essas informações e se sentirem participantes ativas do processo.

Clara Pelaez Alvarez (27/02/2024)

(1) https://www.youtube.com/watch?v=5YGc4zOqozo (acesso em 28/02/2024)

(2) https://www.cnnbrasil.com.br/economia/tres-em-cada-quatro-profissionais-querem-      mudar-de-emprego-em-2023-diz-pesquisa/ (acesso em 28/02/2024)

https://epocanegocios.globo.com/colunas/profissionais-da-nossa-epoca/coluna/2023/02/60percent-dos-profissionais-estao-insatisfeitos-com-o-emprego-atual-e-20percent-ja-estao-procurando-uma-nova-posicao.ghtml (acesso em 28/02/2024)

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